Ex-ministro advogado de
Cachoeira, Thomaz Bastos é acusado de crime
O criminalista Márcio
Thomaz Bastos já foi advogado do hoje ex-presidente Lula, presidente da Ordem
dos Advogados do Brasil (1987) e ministro da Justiça entre 2003 e 2007. Hoje
defende o bicheiro Carlos Augusto Ramos, pivô da CPMI do Cachoeira. Se
depender de uma representação feita pelo procurador Regional da República no Rio
Grande do Sul Manoel Pastana, Bastos será investigado agora por supostamente
ter praticado crime de lavagem de dinheiro ou receptação não intencional de
recursos de atividades criminosas. Pastana adiantou que pretendia ingressar com
a ação contra Thomaz Bastos ainda nesta terça-feira.
Para Pastana, o fato de Thomaz Bastos receber R$ 15 milhões em
honorários para defender Cachoeira é
indício de crime. Na representação à Procuradoria da República em Goiás, à qual
o sítio na internet Congresso em Foco teve acesso exclusivo, Pastana
argumenta que o bicheiro não tem recursos de origem lícita para bancar tamanha
despesa. Assim, ele quer saber de que forma ele paga os serviços do ex-ministro
da Justiça. Para tanto, o procurador pede a quebra dos sigilos bancário e
fiscal de Thomaz Bastos e informações ao Conselho de Atividades Financeiras
(Coaf) sobre eventuais movimentações ilegais de dinheiro do exterior.
Na opinião de Pastana, são claros os “indícios” de que Bastos
cometeu ou está prestes a cometer um crime. E poderia mesmo ser preso. “A
prisão em flagrante é possível, caso o advogado seja pego recebendo os recursos
oriundos de condutas ilícitas praticadas por Cachoeira”, argumentou Pastana no
documento em vias de ser protocolado no Ministério Público Federal.
Thomaz Bastos foi informado da representação no início da noite
de ontem. Ele disse ao Congresso em Foco que poderia prestar esclarecimentos às
21h, mas, no horário combinado, não atendeu mais ao telefone e nem respondeu às
mensagens de texto enviadas.
Bens bloqueados
Cachoeira está com os bens bloqueados. Assim,ele não tem como
pagar R$ 15 milhões a Thomaz Bastos para defendê-lo. “A medida restritiva
parece não ter sido suficiente, porquanto, se o fosse, ele não teria condições
de custear o contrato advocatício”, disse Pastana na representação. Segundo
noticiou no domingo a coluna Radar, da revista semanal de ultradireitaVeja, Bastos disse
que são os amigos que custeiam as despesas de clientes em situações como estas.
A mesma revista informou que os R$ 15 milhões foram divididos em três parcelas,
a primeira já paga.
Na representação ao Ministério Público Federal em Goiás, Pastana
disse que a lei da lavagem de dinheiro impede alguém de adquirir ou receber
valores provenientes de crimes contra a administração pública ou praticados por
organização criminosa – caso de Cachoeira. Se não há indício de branqueamento
de recursos, o procurador entende que o art. 180 do Código Penal prevê a
receptação não intencional de “coisa que sabe ser produto de crime”. Na mesma
situação enquadra-se quem recebe valores que, “pela condição de quem a
oferece”, permitem presumir-se terem sido obtidos com crimes, diz o mesmo
artigo da lei.
Este é o caso, de acordo com Pastana. “Toda sociedade brasileira
sabe que Cachoeira não tem condição de pagar honorários elevados com renda
lícita; logo, é de se presumir que os recursos foram obtidos por meio
criminoso”, argumentou.
Assassino
Apesar de não embasar seu pedido em questões morais, o
procurador disse que Bastos agiu de maneira antiética. Ele disse não ser
“razoável” que Thomaz Bastos, que, como ministro da Justiça, teve a missão de
“defender o Estado brasileiro da ação deletéria de infratores”, agora passe a
defender um desses infratores. “Isso fere de morte a ética e a moral.”
Pastana disse na representação que, se nada for feito, Carlinhos
Cachoeira vai se aproveitar dos resultados dos crimes cometidos por ele.
“Permitir que o dr. Márcio Thomaz Bastos usufrua de tais recursos seria o mesmo
que (…) entender lícito que o advogado receba honorários de assassino, que paga
sua defesa com o dinheiro recebido para matar a vítima”, criticou.
O procurador disse ao Congresso em Foco que não é contra que os criminosos em
geral tenham advogados pagos, o que seria uma limitação antidemocrática à defesa
deles. Entretanto, Pastana afirmou que eles têm que pagar honorários de acordo
com os recursos lícitos que possuem. Ou utilizar os serviços da Defensoria
Pública.
Defesa moral
Thomaz Bastos, no entanto, conta com a defesa da OAB de São
Paulo à causa que abraçou, do ponto de vista moral. Acerca da ação proposta
pela questão pecuniária, procurado pelo Correio do
Brasil nesta
manhã, o advogado ainda não havia retornado às ligações. Em nota oficial,
divulgada no domingo, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil em São
Paulo (OAB-SP), Luiz Flávio D’Urso, rebateu críticas feitas ao advogado do
contraventor Carlinhos Cachoeira. Ele foi hostilizado, recentemente, em
decorrência do cliente que defende.
D’Urso afirma, na nota, que o papel do advogado é obrigatório e
absolutamente indispensável para que se obtenha justiça, além de que jamais se
pode confundir o advogado com seu cliente.
“Rui Barbosa foi incisivo ao afirmar que ninguém é indigno de
defesa.”, afirma.
A nota afirma ainda que a repercussão de casos como os da
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de Cachoeira não deve gerar hostilidade
ao advogado.
“Diante de julgamentos de crimes de grande repercussão, quando o
público em geral não admite ao acusado nem mesmo argumentos em sua defesa,
imediatamente a opinião pública antagoniza o advogado que, para cumprir bem sua
função, precisa enfrentar esse pré-julgamento sem temor, com total
independência, apesar da incompreensão.”
Segundo o presidente, o fato de o advogado Márcio Thomaz Bastos
ter sido ministro da Justiça, não lhe impediria de advogar livremente, fato que
já ocorreu com outros advogados que ocuparam postos e cargos de destaque na
política nacional.
O papel social e institucional do advogado, segundo D’Urso, é
imprescindível nos regimes democráticos assegurando a todos os cidadãos a
observância de seus direitos constitucionais e legais. O advogado não pode ter
sua figura confundida com a de seu cliente, não deve ser hostilizado pela
opinião pública e pelas autoridades policiais ou judiciárias, ou ainda sofrer
“linchamento moral” por parcela da mídia. “Defender prerrogativas é defender
cidadania. Por isso é que lutamos para aprovação do nosso projeto que
criminaliza a violação às prerrogativas dos advogados”, defende.
“A OAB-SP mais uma vez vem a público, não só para prestar
solidariedade ao colega atacado, mas para esclarecer à sociedade sobre essa
indispensável missão, fazendo a Ordem, a defesa pública da defesa, que acontece
quer pelas mãos do festejado advogado Márcio Thomaz Bastos ou pelo mais humilde
dos colegas, todos cumprindo papel da mesma relevância, com a mesma coragem e
dignidade, em prol da justiça”, finaliza o presidente.
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