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No dia 1º de abril de 1964, a conspiração
que uniu as altas esferas do empresariado brasileiro, os latifundiários, os
chefes militares, a hierarquia católica conservadora e agentes do imperialismo
dos EUA depuseram o presidente constitucional João Goulart e deram início à
ditadura militar que marcou as duas décadas seguintes pelo sangue dos patriotas
e democratas, pela destruição da democracia e do Estado de Direito no Brasil.
Desde aquele dia inaugural da ditadura, a
data que tem sido lembrada é a da véspera, 31 de março, pela folclórica razão
de que, sendo o 1º de abril o dia da mentira, o golpe militar se tornaria alvo
de chacota entre o povo.
O 1º de abril teria sido o dia mais
indicado para lembrar aquele episódio nefasto. Era mentira que os golpistas
defendiam a democracia, como alegavam; não era verdade que defendessem a
soberania brasileira nem o desenvolvimento do país.
Contra a democracia, rasgaram a
Constituição, instituíram a legislação de exceção que permitiu a cassação de
direitos políticos e democráticos e de mandatos eletivos, no esforço de
eliminar do cenário político parlamentares, sindicalistas, democratas,
patriotas, lideranças de trabalhadores e do povo, que não aceitavam o arbítrio
da ditadura. O rosário de assassinatos, tortura, prisões ilegais, exílio e
outras formas de opressão contra os que resistiam à ditadura é conhecido e o
preço pago em sangue pelos brasileiros é irresgatável e inegociável.
Diziam que defendiam a nação contra a
ameaça representada pela URSS e pelos comunistas no Brasil. Mas quem humilhou o
país e desrespeitou a soberania nacional foram os generais e as classes
dominantes que, com completo apoio da embaixada dos EUA, deram o golpe militar.
Basta lembrar o discurso pronunciado pelo general Castello Branco, na sede do
Itamaraty, em 31 de julho de 1964, onde o principal líder da conspiração
golpista e então primeiro ocupante militar da Presidência da República defendeu
a tese anti-nacional do alinhamento automático com os EUA, com a conseqüente
limitação da soberania brasileira.
Em relação ao desenvolvimento, naquelas
duas décadas a economia realmente cresceu. Mas não foi um desenvolvimento
nacional: a internacionalização foi aprofundada como nunca, a dependência
tecnológica foi agravada pela opção do crescimento com base em empresas
estrangeiras, a distorção na distribuição de rendas e no agravamento dos já
agudos problemas sociais foi gigantesca. A modernização conservadora do campo
expulsou multidões para as periferias das cidades, onde o desemprego, a baixa
renda e as precárias condições de moradia, educação e saúde formaram o caldo de
cultura onde viceja a violência e a insegurança.
Do ponto de vista institucional, uma
herança perversa e insepulta da ditadura militar é a impunidade da violência
policial, que torna a polícia brasileira uma das mais violentas do mundo, com
sua atuação marcada pela tortura como forma rotineira de investigação e a morte
de suspeitos como uma prática cotidiana.
O que há a comemorar? Bem fizeram os
atuais comandantes militares que, pela primeira vez em 47 anos, retiraram a
lembrança do golpe de 1964 de sua agenda de comemorações, gesto simbólico do
sentimento democrático que anima a nova geração de chefes militares.
A velha geração continua saudosa do poder
irrestrito e irresponsável que exerceu naqueles anos de atentados contra a
democracia e os democratas, como mostra o manifesto comemorativo divulgado
pelos clubes Militar, Naval e da Aeronáutica, saudando o rompimento da
democracia e a manutenção e agravamento de uma ordem injusta rejeitada pelos
brasileiros e apoiada apenas pelas elites proprietárias e por seus aliados
imperialistas.
Foi o regime da tortura e do assassinato
político e seus remanescentes usam o prestígio que ainda lhes resta para
acobertar aquelas práticas ilícitas e desumanas, rejeitando qualquer
investigação daqueles crimes e opondo-se à formação da Comissão da Verdade para
revelar à nação o rio de sangue que correu no país nos anos em que estavam no
poder.
O golpe militar de 1964 é um fato da
história que os brasileiros lamentam e não aceitam mais. A democracia
brasileira se fortalece, apesar dos resmungos das viúvas da ditadura. E, hoje,
a melhor maneira de lembrar aquele passado é homenagear os heróis da
resistência, os patriotas, democratas, socialistas e comunistas que nunca
aceitaram a mentira da ”Redentora” e verteram seu sangue pelos direitos do povo
e dos trabalhadores e pela soberania da Pátria. Estes não podem ser esquecidos
jamais.
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Dag Vulpi