quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Das consequências políticas da reconstrução do ES


Por José Roberto Bonifácio*

Quando for aprovado pelo plenário da Assembleia Legislativa o "Plano de Reconstrução do estado do ES", ao contrário dos demais lançamentos do governo estadual, deverá acarretar uma séria mudança de cenário na Política Capixaba. Se por um lado não se vislumbra claramente transformações muito drásticas na trajetória das políticas públicas formuladas, geridas e implementadas regionalmente, ao menos os contornos da dinâmica eleitoral da sucessão se tornam mais claros e distintos.

 Em primeiro lugar, a implementação do conjunto de medidas com recursos federais deve atrelar o ES ainda mais à União e diminuir a margem de manobra do governador. Por um lado terá havido um realinhamento de expectativas do eleitor capixaba para com o governo federal após quase uma década de sentimento de abandono regional ou de hostilidade e indiferença nas relações centro-periferia - os episódios da extinção do Fundap e da redistribuição de royalties ainda pesam muito na memória dos formadores de opinião. Por outro lado, o governador, enquanto gestor e responsável pela qualidade e pela consistência das políticas públicas deverá vir a ser cada vez mais demandado e exigido. Esta é a consequência mais evidente e imediata dado o potencial das apostas envolvidas.

A outra possível repercussão é que o "chapão" ou supercoalizão eleitoral, já consumado - a contragosto de muitos e a gosto de poucos - em 2010, há que se reproduzir uma vez mais na campanha de 2014. Bem verdade que este já é um desfecho antecipado há certo tempo pelos observadores. A novidade talvez seja que tal triunfo da "unanimidade" deverá se dar, mas duma maneira muito adversa, assimétrica e imprevisível para os grupos e partidos integrantes (PT, PSB, PMDB). Constata-se que as posições relativas dos coligados se alteraram em decorrência da crise climática-logística-infraestrutural-urbana-sanitária de fins do ano anterior, e ainda que os ganhos e as perdas da situação não sejam absolutamente claros, as taxas de risco que alguns se predispõem a assumir relativamente aos outros dão a entender que seu comportamento não podia ficar impassível ou estático. Em outras palavras, o equilíbrio interno de cada partido sofreu seríssimos abalos.

 Outra novidade em relação a 2010 é que o ex-governador Paulo Hartung deverá se impor como candidato ao Senado e assim fazendo terá chances de reeditar algo similar ao "governo paralelo" - episodio de rivalidades entre o ex-governador Max Mauro e o ex-senador Camata na segunda metade dos anos 1990 que acarretou graves danos ao estado. Bem verdade (e esta é uma circunstancia que tolhe a hipótese aqui aventada) é que o capital político deste se acha em severa deterioração em decorrência das desventuras do filhote político que elegera como prefeito de Vila Velha - maior colégio eleitoral do estado - um ano antes visando derrotar um tradicional desafeto político. Recursos vultosos hão que ser canalizados dos governos federal e estadual, neste e no próximo quatriênio, para evitar que o Hartunguismo encontre no município canela-verde o seu Vietnã, i.e., o seu atoleiro político-eleitoral duradouro, insolúvel e corrosivo. Os sete votos peemedebistas na ALES durante a sessão extraordinária de amanhã terão estes dois significados e ainda o da necessidade de reeleger os respectivos parlamentares na legislatura.

Resolve-se a questão interna do PMDB que dividia os que são leais ao governo estadual (basicamente prefeitos e legisladores estaduais) e os que com ele romperam assim como tem postura independente quanto ao governo federal (Dep. Lelo Coimbra e Sen. Ricardo Ferraço). Ou melhor: adia-se o embate por mais alguns anos dado que nem a direção regional nem a bancada compromete sua posição atual ou precisa assumir riscos ou perdas maiores (numa aventada pré-candidatura majoritária ferracista ao Palácio Anchieta ou, pior, na potencial "cristianização" da mesma) que aqueles já incorridos.

Por seu turno, os vencedores do pleito estadual anterior, PT e PSB, devem passar por longos e destrutivos processos de autofagia decorrentes do inchaço das chapas proporcionais, mercê de estratégias agressivas de recrutamento e cooptação de lideranças no segundo caso e de impasses do diretório regional na escolha seja do nome para a vice-governadoria seja para a senadoria, em detrimento das demais tendências, no primeiro caso. Se o "Plano" ajuda o PSB a acomodar-se melhor com o eleitorado e com o PMDB, e ajuda a este ultimo a entender-se melhor consigo mesmo, o mesmo resultado pacificador não se pode esperar que ocorra no PT, dada a singularidade de sua competição interna e a seu caráter como a legenda do governo federal. Para este a grande vitória auferida com o episódio há de ser a neutralização do estado capixaba como potencial cabeça de ponte para a candidatura de Eduardo Campos e Marina Silva (PSB/REDE) no sudeste. Quando os 5 deputados estaduais petistas registrarem seus votos no plenário haverão que ter com clareza minimamente esta garantia do Executivo, quando não puderem ter clareza de que as divergências internas ou ainda com o mesmo partido do governador foram aplainadas.

Nesse ínterim, uma vez que o Plano seja aprovado pelos legisladores estaduais, o governador Renato Casagrande (e por conseguinte o PSB) terá diante de si ao longo de todo o ano - e possivelmente durante todo o (hoje) altamente provável segundo mandato - duas escolhas de Sofia: 

(1) descumprir compromissos assumidos nas campanhas marqueteiras e deixar o ES arrasado e estagnado; 

(2) honrar os compromissos e para isto contrair novos pactos com aqueles a quem suplantara anteriormente (PMDB e PT).

A opção (1) deixa todos no pior dos mundos e arrasa com prospectos eleitorais dos parlamentares. Assim fazendo defrontar-se-à com a "sorte" que hoje assola o prefeito Rodney Miranda e seu patrono politico.

Neste caso é o Pessebismo quem encontra o seu "Vietnã".

A opção (2) melhora a situação de todos e clareia os prospectos eleitorais mas amarra o governador completamente no segundo mandato em face da do risco de se frustrar expectativas. Neste caso o cenário não é tão catastrófico mas nem por isto mesmo soa muito animador.

Para ser mais do que uma mera peça de marketing como pretendem sinceramente que seja, o "Plano de Reconstrução do ES" tem que materializar realizações e resultados já no médio prazo, o que, pela magnitude das incertezas, dos desafios e das complexidades envolvidas já faz com que o mesmo difira das outras iniciativas da atual Administração. Não pode ser factoide pois mexe concreta, direta e palpavelmente com o bem-estar do cidadão-eleitor-contribuinte. Entretanto, para as lideranças políticas estes potenciais ganhos (ou perdas) já estão contabilizados no presente uma vez que não podem ser adiados e os riscos - para os que se colocam no domínio das perdas- não podem deixar de ser incorridos.

* José Roberto Bonifácio - Sociólogo (UFES) e Especialista em Ciência Política (IUPERJ). Professor da UVERSITA - Universidade Aberta (SP) e do curso de Pós- Graduação Lato Sensu Gestão de Instituições sem Fins Econômicos com ênfase em Medidas Sócioeducativas da Faculdade Unidas (ES).

2 comentários:

  1. Um artigo de fôlego! Parabéns ao conjunto da obra, José Roberto Bonifácio.
    Abração, Dagmar!

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    1. Boa noite Deciolive,

      Agradeço sua visita e comentário aqui no blog.

      Realmente o nosso amigo Jose R Bonifácio foi muito feliz ao escrever este artigo. Ele fez uma ótima leitura do momento político pós Dilúvio no ES. rss

      Abração e um ótimo 2014.

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