segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Queda nos juros dos títulos públicos desestimula especulação, dizem especialistas


Atualmente em 8% ao ano e no menor nível da história, os juros básicos (taxa Selic) atravessam um ciclo de redução que provocou um fenômeno nas contas públicas brasileiras. Pela primeira vez na história, os títulos públicos deixaram de pagar juros de mais de 10% ao ano. A queda beneficia não somente o governo, que gasta cada vez menos para financiar a dívida pública, mas tem reflexos sobre toda a economia.

Segundo especialistas, os juros menores dos títulos públicos desestimulam a especulação e incentivam a economia produtiva. O dinheiro que antes obtinha rendimentos altos e seguros nos papéis do governo precisa cada vez mais ser aplicado nas empresas para alcançar o retorno antes conseguido apenas comprando papéis do governo. Aos poucos, o país caminha para uma realidade financeira presente em nações desenvolvidas.

“O que vai acontecer no Brasil é o que ocorre fora do país. Com a inflação baixa, os títulos públicos rendem pouco. Quem quiser ganhos maiores, precisa assumir risco e ir para o mercado acionário ou investir diretamente em novas empresas. Se quiser ganhar dinheiro, tem de produzir”, diz o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel de Oliveira.

Professora de economia monetária e financeira da Universidade de Campinas (Unicamp), Maryse Fahri diz que a queda nos rendimentos dos títulos públicos representa uma conquista. “Estava mais que do que na hora de o governo deixar de pagar mais de 10% [ao ano] para rolar a dívida pública. Uma taxa como essa não fazia nenhum sentido na situação em que o Brasil está. Sabia-se que era uma anomalia”, avalia.
A economista, no entanto, faz uma ressalva. Para ela, os juros dos títulos públicos continuam altos. “O Brasil é um dos poucos países com juros reais [considerando a inflação] positivos. Nas economias desenvolvidas, os títulos públicos costumam pagar taxas reais negativas”, observa Maryse. No último leilão de NTN-B com vencimento em 2023, título público brasileiro que paga os juros mais altos atualmente, o Tesouro Nacional vendeu os papéis com taxa de 9,66% ao ano, cerca de 5 pontos percentuais acima da inflação esperada de 4,5% para 2012.

O vice-presidente da Anefac concorda que os juros brasileiros ainda são altos, mas destaca a melhora da situação. “Na verdade é um processo. Precisamos baixar muito os juros reais para um intervalo de 0,5% para 1% ao ano. Mesmo assim, a situação está melhor do que há dois ou três anos. Os juros estão em queda, e a inflação está mais baixa”, aponta.

Maryse acredita que a mudança é estrutural, e os títulos públicos dificilmente voltarão a render mais de 10% ao ano. “Pode ser que, em algum momento, o governo volte a aumentar os juros básicos como medida de política monetária [para conter a inflação], mas os investidores começarão a perceber que não se justifica um risco tão alto [para comprar papéis do governo]. Aos poucos, o Brasil deixa de ser o paraíso dos juros altos.”

Por meio dos títulos públicos, o governo pega emprestado dinheiro dos investidores para honrar compromissos. Em troca, o Tesouro Nacional se compromete a devolver o dinheiro com alguma correção. Essa diferença é expressa nos juros que incidem sobre os papéis. Taxas mais altas refletem o risco de o governo dar calote e não conseguir pagar os aplicadores.

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