Diante da perspectiva de terminar
seus dias na cadeia, o publicitário começa a revelar os segredos que guardava
O empresário
Marcos Valério, na porta da escola do filho, em Belo Horizonte, na última
quarta-feira: revelações sobre o escândalo
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Por Rodrigo Rangel
Dos
37 réus do mensalão, o empresário Marcos Valério é o único que não tem um átimo
de dúvida sobre o seu futuro. Na semana passada, o publicitário foi condenado
por lavagem de dinheiro, crime que acarreta pena mínima de três anos de prisão.
Computadas
punições pelos crimes de corrupção ativa e peculato, já decididas, mais evasão
de divisas e formação de quadrilha, ainda por julgar a sentença
de Marcos Valério pode passar de 100 anos de reclusão. Com todas as
atenuantes da lei penal brasileira, não é totalmente improvável que ele termine
seus dias na cadeia.
Apontado
como responsável pela engenharia financeira que possibilitou ao PT montar o
maior esquema de corrupção da história, Valério enfrenta um dilema. Nos últimos
dias, ele confidenciou a pessoas próximas detalhes do pacto que havia firmado
com o partido.
Para
proteger os figurões, conta que assumiu a responsabilidade por crimes que não
praticou sozinho e manteve em segredo histórias comprometedoras que testemunhou
quando era o "predileto" do
poder. Em troca do silêncio, recebeu garantias. Primeiro, de impunidade.
Depois,
quando o esquema teve suas entranhas expostas pela Procuradoria-Geral da
República, de penas mais brandas. Valério guarda segredos tão estarrecedores
sobre o mensalão que ele não consegue mais guardar só para si - mesmo que
agora, desiludido com a falsa promessa de ajuda dos poderosos a quem ajudou,
tenha um crescente temor de que eles possam se vingar dele de forma ainda mais
cruel.
Feita
com base em revelações de parentes, amigos e associados, a reportagem de capa
de VEJA desta semana reabre de forma incontornável a questão da participação do
ex-presidente Lula no mensalão. "Lula era o chefe", vem repetindo
Valério com mais freqüência e amargura agora que já foi condenado pelo
STF.
Assinada
pelo editor Rodrigo Rangel, da sucursal de Brasília, a reportagem tem cinco
capítulos - e o primeiro deles pode ser lido abaixo:
A
acusação do Ministério Público Federal sustenta que o mensalão foi abastecido
com 55 milhões de reais tomados por empréstimo por Marcos Valério junto aos
bancos Rural e BMG, que se somaram a 74 milhões desviados da Visanet, fundo
abastecido com dinheiro público e controlado pelo Banco do Brasil. Segundo
Marcos Valério, esse valor é subestimado.
Ele
conta que o caixa real do mensalão era o triplo do
descoberto pela polícia e denunciado pelo MP. Valério diz que pelas
arcas do esquema passaram pelo menos 350 milhões de reais. "Da SMP&B vão achar só os 55 milhões, mas
o caixa era muito maior. O caixa do PT foi de 350
milhões de reais, com dinheiro de outras empresas que nada tinham a ver
com a SMP&B nem com a DNA", afirma o empresário.
Esse
caixa paralelo, conta ele, era abastecido com dinheiro oriundo de operações tão
heterodoxas quanto os empréstimos fictícios tomados por suas empresas para
pagar políticos aliados do PT. Havia doações diretas diante da perspectiva de
obter facilidades no governo. "Muitas empresas davam via empréstimos, outras não."
O fiador dessas operações, garante Valério, era o próprio presidente da
República.
Lula
teria se empenhado pessoalmente na coleta de dinheiro para a engrenagem
clandestina, cujos contribuintes tinham algum interesse no governo federal.
Tudo corria por fora, sem registros formais, sem deixar nenhum rastro. Muitos
empresários, relata Marcos Valério, se reuniam com o
presidente, combinavam a contribuição e em seguida despejavam dinheiro no cofre secreto petista.
O
controle dessa contabilidade cabia ao então tesoureiro do partido, Delúbio
Soares, que é réu no processo do mensalão e começa a ser julgado nos próximos
dias pelos crimes de formação de quadrilha e corrupção ativa.
O
papel de Delúbio era, além de ajudar na administração da captação, definir o nome
dos políticos que deveriam receber os pagamentos determinados pela cúpula do
PT, com o aval do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, acusado no processo
como o chefe da quadrilha do mensalão: "Dirceu era o braço direito do Lula, um braço
que comandava".
Valério
diz que, graças a sua proximidade com a cúpula petista no auge do esquema, em
2003 e 2004, teve acesso à contabilidade real. Ele conta que a entrada e a
saída de recursos foram registradas minuciosamente em um livro guardado a sete
chaves por Delúbio.
Pelo
seu relato, o restante do dinheiro desse fundão teve destino semelhante ao dos
55 milhões de reais obtidos por meio dos empréstimos fraudulentos tomados pela
DNA e pela SMP&B. Foram usados para remunerar correligionários e aliados.
Os valores calculados por Valério delineiam um caixa clandestino sem paralelo
na política. Ele fala em valores dez vezes maiores que a arrecadação declarada
da campanha de Lula nas eleições presidenciais de 2002.
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