terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Vem aí o pedágio urbano

Por Romeu Prisco*

São Paulo (SP) - No meu tempo de garoto, circulavam pelas ruas de São Paulo somente veículos importados, com predominância Ford e Chevrolet, enquanto outros, em minoria, também eram vistos, como Buick, Cadillac, Chrysler, Lincoln, Mercury, Nash e Pontiac, todos norte-americanos. Os de menor porte eram europeus, como Morris e Austin (ingleses), Fiat Topolino (italiano), Citroën (francês) e Volvo (sueco).
Quem os possuía era um privilegiado e quem não os possuía ficava com água na boca. Com o advento das montadoras nacionais, a partir do Governo Juscelino Kubitschek, este sonho de consumo dos brasileiros de classe média tornou-se realidade e as nossas ruas foram tomadas pelos veículos Volkswagen ("Fusca"), Brasília, DKW, Gordini, Vemaguet, Maverick, Opala e Simca Chambord ("Belo Antonio"). Tinha ainda o pioneiro Romi Isetta, com capacidade para duas pessoas, que se movimentava sobre três rodas.
Aos poucos o Governo se deu conta dessa mina de fazer dinheiro e passou a tributar, direta e indiretamente, tudo que dizia respeito aos veículos motorizados, para transporte de passageiros. Desnecessário mencionar, aqui, toda a carga tributária que recai sobre os carros, na compra e venda, no licenciamento, na circulação, no estacionamento em áreas públicas e nos combustíveis que os alimentam.
O pedágio não deixa de ser uma forma de tributo. Foi antecedido pela TRU (Taxa Rodoviária Única), que, por sua vez, foi substituída pelo IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor), dando, assim, ensejo à cobrança autônoma do pedágio, nas rodovias estaduais e federais. Agora, prezados motoristas, preparem seus bolsos, pois aí vem o pedágio urbano, embutido na floreada Lei nº. 12.587, de 03.01.2012, que, pomposamente, instituiu a "Política Nacional de Mobilidade Urbana".
Resumidamente, dita política pretende desestimular o tráfego de veículos particulares nas cidades, para incentivar o uso de transporte coletivo, contando com a cobrança do pedágio urbano como estratégia inibidora do apelo aos carros. Tudo com a surrada promessa de disponibilizar à população um transporte público moderno, eficiente, barato e confortável. Estarei vendo alguma mão levantada, de quem acredita nesta balela ?
Não deixa de ser uma enorme incoerência a constante prática do Governo Federal de diminuir sensivelmente a alíquota do IPI incidente sobre veículos novos ("zero"), a fim de alavancar a indústria automobilística, desde que os seus adquirentes, cercados de restrições, os deixem na garagem de casa. Futuramente, ainda terão de pagar pedágio para retirá-los e retorná-los ao estacionamento domiciliar !
De acordo com o artigo 2º. da Lei recentemente promulgada, "a Política Nacional de Mobilidade Urbana tem por objetivo contribuir para o acesso universal à cidade, o fomento e a concretização das condições que contribuam para a efetivação dos princípios, objetivos e diretrizes da política de desenvolvimento urbano, por meio do planejamento e da gestão democrática do Sistema Nacional de Mobilidade Urbana." Obviamente, algo e alguém deverão sustentar tão nobre e elevado plano. Ora, não há melhor saída que instituir e cobrar pedágio urbano, mesmo porque a quantidade de impostos atualmente existente, como de hábito, é insuficiente para atendimento de todas necessidades municipais.
A Política Nacional de Mobilidade Urbana aplica-se aos municípios com mais de 20.000 habitantes e a outros assim obrigados "na forma da lei" (sic), tendo eles, municípios, o prazo máximo de três (3) anos para elaborar e integrar o Plano de Mobilidade Urbana ao plano diretor municipal. Equivale dizer: o pedágio urbano poderá ser cobrado somente dentro de três anos. Todavia, não será surpresa se muitos municípios, ou todos, alegarem já possuir referido plano, julgando-se, portanto, no direito de cobrar imediatamente o pedágio urbano. Pelo menos é o que dá a entender a lei.
Na minha previsão, acho que esse assunto sequer será debatido em 2012, pois trata-se de ano de eleições municipais. Os candidatos a Prefeito e seus partidos, esperta e sorrateiramente, irão manter, nas suas campanhas, o mais absoluto silêncio. A partir de 2013, salve-se quem puder, porque a intenção final é mesmo a cobrança de pedágio urbano, caso contrário, não se justificaria a sua incidência em minúsculas cidades com mais de 20.000 habitantes. Este número é inferior a 1/10 da população do bairro em que moro na cidade de São Paulo !
Os veículos oficiais dos prefeitos e dos seus auxiliares, tanto quanto os veículos oficiais das demais "autoridades", sejam elas municipais, estaduais, ou federais, sempre "a serviço do povo", terão livre trânsito pela Avenida Paulista, isentos da tarifa. Igual tratamento será dispensado a outros veículos, não oficiais, portadores de um "selinho" afixado no parabrisa, em "situações excepcionais, previstas em regulamento". É assim que as coisas funcionam num regime democrático, como o nosso, onde todos são iguais perante a lei.
Nada semelhante ao monárquico sistema introduzido em Londres, cujo Prefeito ousou cobrar pedágio do carro que transportava o Presidente estadunidense Barack Obama, na sua visita àquela cidade, não poupando, inclusive, veículos do corpo diplomático sediado na capital inglesa. 

Romeu Prisco* Paulistano, advogado e ator, dedica-se, atualmente, à arte de escrever artigos, crônicas, contos e poemas, publicados em espaços literários e jornalísticos, impressos e virtuais. Define-se como um sonhador, que ainda acredita nos seus sonhos. 

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