quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Jairo Jorge: “Precisamos fazer de fato uma reforma política, e não um arremedo, que não vai aperfeiçoar a democracia brasileira.”

jairo jorge
Jairo Jorge pref. de Canoas RS
O prefeito de Canoas, na Grande Porto Alegre (RS), Jairo Jorge (PT), apoia o voto distrital, apesar de o seu partido ainda não ter “formalizado o debate do assunto.”
Para o prefeito, a aproximação entre o eleitor e o eleito é um dos principais benefícios da representatividade distrital. Jorge também acredita que o modelo eleitoral atual é difuso e gera um desencanto com a política: “as pessoas não se identificam a partir de um território – o que leva ao afastamento e a este abismo entre o representado e o representante.”

O sistema político brasileiro hoje enfrenta um dilema. Nós temos uma crise de representação. Os representados não se sentem mais contemplados nos seus representantes. Há portanto, uma crise de legitimidade. Há um distanciamento entre o representante e o representado. Este modelo eleitoral é um modelo difuso: as pessoas não se identificam a partir de um território – o que leva ao afastamento e a este abismo entre o representado e o representante. O afastamento gera um desencanto com a política, distancia as pessoas da cena pública – na medida em que a esfera pública é o palco onde os representantes expressam as idéias dos representados.
Penso que o sistema eleitoral vigente aprofunda a crise de legitimidade, de representatividade, o ceticismo e o desencanto das pessoas com a política. Na minha opinião, o voto distrital estabelece um território e uma identidade maior do representante com o representado – um vínculo que é essencial, pois o território é um elemento basilar de identidade das pessoas –  e pode inclusive recuperar a política, reencantar as pessoas e estabelecer uma cobrança maior das pessoas, que podem passar a exigir mais transparência, gerando maior controle social. Eu defendo o voto distrital, pois entendo que ele é um instrumento efetivo para reencantar as pessoas e aproximar o representante do representado.
Eu tenho uma visão crítica em relação a este modelo difuso que nós temos e às alternativas que estão sendo discutidas, como o voto em lista, por exemplo. O voto em lista tem como base a defesa do partido, mas isso não se faz por decreto. O fortalecimento dos partidos se dá a partir do ideário, dos programas políticos, em cima de uma maior nitidez daqueles que representam o programa de governo, aqueles que estão ocupando cargos públicos, seja no executivo ou no legislativo.
O sistema que temos hoje, ou até mesmo essas sugestões, podem agudizar este desencanto e esse distanciamento, o que leva a uma ausência de fiscalização e controle, permitindo com isso que se amplie a corrupção e práticas negativas. Porque quanto mais vínculo tivermos entre o eleitor e aquele que exerce o mandato – até porque a política não é uma profissão, é uma função pública – quanto maior a proximidade maior o controle e dessa forma teremos mecanismos efetivos de enfrentamento à corrupção.
Penso que o voto distrital é um instrumento que nos auxilia a ter maior controle social e a enfrentar essa chaga que é a tradição patrimonialista que temos hoje no Estado brasileiro. É preciso quebrar essa tradição e criar um círculo virtuoso na política e acho que o voto distrital tem esse poder.
Acho que precisamos fazer um profundo debate e temos que galvanizar a opinião pública. O status quo quer manter o modelo que temos, ou um sistema misto, ou ainda um sistema de listas – em que as burocracias partidárias terão um controle maior. Acho que temos um potencial – o Brasil é uma nação que é referencia no mundo por sua democracia, pela capacidade de responder democraticamente, com instituições sólidas e com um processo muito transparente. Mesmo uma democracia sólida e estável como a norte-americana já viveu impasses com seu modelo. Mas a democracia brasileira tem esse vigor e isso é um mérito, mas é preciso galvanizar a opinião pública e enfrentar o status quo, os setores que não querem a mudança, e sensibilizar a sociedade para a importância do debate.
Temos uma janela de oportunidade, me parece que temos o mecanismo. Os partidos tem que discutir isso. Mas precisamos aproveitar o processo de reforma política e fazer de fato uma reforma política e não um arremedo,  que não vai aperfeiçoar a democracia brasileira.
Iniciativas como essa são fundamentais porque pensar a sério o Brasil, promover o debate de forma madura, avaliando os conteúdos, avaliando o pensamento, isso é a base de uma sociedade democrática. Essa iniciativa do Instituto Millenium de trazer à cena e não ter medo de fazer um debate coloca na ordem do dia essa agenda. Mostra que é possível, sim,  fazer uma mudança mais substancial e,  dessa maneira, contribuir para a evolução democrática no Brasil. Acho que todas as instituições deveriam se pautar dessa forma. Há uma certa apatia na sociedade brasileira em relação a reforma política. Nós precisamos entender que o Estado brasileiro vai ser a expressão da sociedade brasileira, a sua imagem refletida, se conseguirmos aperfeiçoar o processo democrático, aperfeiçoar os mecanismos de participação e representação. Enquanto isso não ocorrer, teremos essa imagem distorcida da realidade do país que se espelha dentro do congresso, das câmaras de vereadores e das assembleias legislativas. Vejo essa iniciativa com muito entusiamo e espero que prospere e que outras entidade façam o mesmo debate, enxergando nessa mudança e no potencial do voto distrital para a democracia brasileira, a oportunidade da reforma política.
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