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sábado, 10 de junho de 2017

Frente independente – um caminho possível para a esquerda brasileira (2)

Por James Connolly do Santa

No texto anterior eu falei das delícias de se constituir uma frente progressista independente. É chegada a hora, no entanto, de falar das dores que tal empreitada trará à tona se levarmos a ideia à frente.

Quem assistiu “A Vida de Brian”, clássico da trupe de humor inglesa Monty Python, sabe que uma das especialidades da esquerda é rachar. As diferenças de visão e de prática são um dos principais motivos para o fim da famosa “unidade da esquerda®”. A menor divergência é motivo para que um grupo se separe lançando anátemas um ao outro, e achando que vai conseguir fazer a revolução® sozinho. Eu mesmo já passei por discussões homéricas com meus pares de outros grupos (outras questões, de ordem pessoal, estavam envolvidas no meio, mas não cabe falar delas neste espaço).

Saiba Mais:

Aí vem a pessoa e me diz: “Bicho, tu tá doido? Tu vai querer colocar diferentes grupos de esquerda num mesmo espaço de militância, reflexão e ação? Quero só ver o que tu vai fazer quando o petista xingar o psolista de esquerda-que-a-direita-gosta, quando o cara de movimentos sociais arrotar pro filiado a partido que quem fez 2013 foi ele, quando o stalino disser pro trosko que vai fuzilá-lo e o anarquista chegar baixando o sarrafo nos dois…”

Bem, o fato é que é preciso constatar algumas coisas, e eu venho percebendo isso inclusive com uma certa relutância de minha parte, mas a realidade é uma criatura que pouco se importa com os nossos melindres. A primeira é que ninguém vai fazer mudanças sendo a Frente de Libertação Democrática Popular da Judeia (aquele grupo de um homem só no filme). A segunda é que em algum momento alguém vai terminar discordando de você no meio da ação. A terceira é que é preciso ter consciência de que você é um ser humano, que você erra, e que quando alguém te aponta um erro ela não está, necessariamente, sendo escrota com você e se tornando sua inimiga para sempre.

Nos tais Círculos de Estudos e Atividades, penso que a lógica do racha pode ser hackeada reconhecendo que os seus membros constituintes possuirão liberdade para agir como quiser. Se você quiser gritar “Lylamito” na rua, vá lá, você pode gritar. Você quer criticar a galera que age como o cara da hipótese anterior, vá em frente. Quer colocar essas questões em pauta no seu círculo para votação, beleza. A questão é que não necessariamente estas atitudes serão endossadas pelo pleno, em votação democrática, e que na verdade é melhor que não haja endosso explícito, especialmente fora do período eleitoral, nem críticas que tenham um cunho desrespeitoso, que tenham como intenção apenas diminuir alguém por suas opções ou sair se pavoneando com uma superioridade moral que, no fundo, não serve pra muita coisa.

O que vai dar a liga a esse pessoal é o tal do programa mínimo, sob o qual as atividades dos círculos obrigatoriamente ocorrerão, sem um milímetro pra fora (neste caso, a ação ficaria por conta do indivíduo). É a definição daquilo no qual as pessoas concordam e que possam levar a frente com suficiente conforto. Essas questões normalmente surgem em momentos de discussão coletiva e podem ser facilmente identificadas como pontos de partida, e se escolhe avançar. É um processo longo, mas a identificação dos pontos em comum surge com muito estudo e compartilhamento de ideias, cabendo ao grupo o fomento desta cultura e a coibição de práticas puramente destrutivas. Alguns grupos políticos chamam isso de consenso progressivo.

Os membros dos círculos definem seus programas mínimos e se empenham, com toda energia, em fazê-los avançar. Da mesma forma, é possível que representantes de círculos, em plenárias estaduais e nacionais, definam seus programas mínimos e façam avançá-los. Mas se o pleno de um círculo sinta que a divergência de um ou outro membro à interpretação é inconciliável com suas posições, pode fazer um chamamento a que este faça uma autocrítica ou mesmo que o desligue das atividades. Por mais que tenhamos boa vontade, nem sempre é possível acolher qualquer coisa em nome de bom-mocismo.

Para que isso ocorra, é preciso um ambiente democrático e atuante. Reuniões periódicas, frequentes e utilizando-se dos recursos que a tecnologia proporciona (videoconferência, fórums, etc.) auxiliam neste sentido. Um periódico, como um blog, uma newsletter eletrônica ou até mesmo um fanzine mimeografado (!), ajudam não só na propagação de ideias para fora como também internamente, em que textos com teses teóricas ou de atuação podem ser compartilhados e fomentar um ambiente de debate respeitoso.


Finalmente, gostaria de deixar um aviso contra o “democratismo”, ou seja, aquela tentativa de tentar definir absolutamente tudo através de uma eleição que pode se mostrar por vezes redundante. Atividades de caráter operacional, como por exemplo comunicação, tesouraria, logística, podem ser muito bem deixadas com membros ou comissões eleitas especificamente para aquele fim. Caso contrário, corre-se o risco de paralisação e perda de dinamismo.

Frente Independente – um caminho possível para a esquerda brasileira


Por James Connolly do Santa

Eu não preciso dizer a vocês que a política brasileira está vivendo seu crepúsculo dos deuses. As principais lideranças político-partidárias do país foram abatidas, e nos mesmos escândalos de corrupção (em especial nas propinas da JBS e da Odebrecht). Se caciques do PMDB e do PSDB foram implicados, Lula e algumas eminências pardas do PT também, e não há sinal de que irão sair ilesos também. No entanto, os elementos agregadores do futuro ainda estão em construção, e nem sempre sinalizam algo de bom: Dória e Bolsonaro tentam agitar a direita brasileira, mas falta ao primeiro resultados concretos e ao segundo inteligência, e a ambos falta empatia e compreensão com a população mais humilde e marginalizada. Marina Silva não tem mais o mesmo charme de outrora, tendo em vista que levanta nos ricos desconfiança de que irá levar a cabo suas reformas e nos pobres levanta desconfiança de que irá efetivamente proteger seus direitos, e a Rede ainda não decidiu o que quer ser, além de uma grande tenda mais ou menos libertária.

O Psol ainda precisa gastar sola de sapato e língua nas periferias, deixar ocupar-se mais pela favela, campo e precariado, e construir um programa econômico mais consistente antes de se constituir em uma alternativa séria para o país. Ciro se mostra como uma alternativa por sua boquirrotisse, conseguiu um programa econômico que não é necessariamente progressista (em alguns pontos é francamente de direita) e tem passados (o mais recente é o de governador do Ceará) a lhe assombrarem. Finalmente, existem os aventureiros que são incensados aqui e ali, mas que possuem como projeto algo que vai pouco além do “consertar o Brasil”, se tanto.

No entanto, existem pessoas dentro dos partidos de esquerda e movimentos sociais, e mesmo fora deles (eu diria que a grande maioria está nesta situação) que não gostariam de ficar à mercê dos acontecimentos, que gostariam de discutir a crise das lideranças, e que estão atualmente sem espaço para fazer qualquer coisa.

Seja por não saber como articular um movimento, ou mesmo por não saber que podem fazer tal coisa, estas pessoas hoje em dia se veem órfãs, quando não descambam para o niilismo e a desesperança. Tal realidade precisa mudar, caso queiramos ter um futuro, e eu penso que posso apontar um dos caminhos alternativos. Notem bem: estou elucubrando aqui como faria em uma mesa de bar ou assistindo um jogo do meu querido Santa Cruz Futebol Clube, o tricolor do Arruda. Não estou dizendo que é pra fazer as coisas desse jeito, mas ficaria feliz se alguém tomasse esse rumo.

Eu visualizo o surgimento de Círculos de Estudos e Atividades, onde o propósito seria, bem, estudos e atividades relacionadas a tudo aquilo que se encontre no campo do progressismo. Estes círculos poderiam constituir-se em nível de bairro, município, estado e nacionalmente, e ainda de forma temática, ou ainda virtualmente. Quem conheceu a Raiz vai ver ecos de sua organização aqui, e não por acaso, já que eu já fui parte atuante dela. A organização nestes círculos é uma das coisas boas que ela gerou, e de forma alguma é responsável por sua degeneração (algo que poderemos tratar em outra ocasião). É democrática e comporta ampliação com facilidade.

Estes círculos teriam como responsabilidade a discussão ampla e democrática de alternativas para problemas locais, regionais e nacionais. Nenhuma proposta, no entanto, deve deixar de lado o escrutínio da população onde o círculo está inserida, que fará o juízo final de sua aplicabilidade e evita que se “viaje demais”. As propostas deveriam comportar o seu versionamento, tanto para prover uma contínua atualização bem como recuperação das ideias anteriores para reanálise – e autocrítica por eventuais bobagens ditas anteriormente.

Por envolver a população, é imprescindível que tais círculos realizem um amplo trabalho de divulgação de suas ideias. Seja pelos meios tradicionais (jornais, panfletos, reuniões públicas), seja utilizando novas mídias, é importantíssimo que as ideias saiam da torre de marfim e cheguem a todos. Também por isso, os círculos deverão priorizar o contato com as populações da periferia, os trabalhadores urbanos precários, as comunidades rurais e tradicionais e as pequenas cidades do interior.

O objetivo seria criar uma frente progressista nacional e independente, de caráter suprapartidário, que admitiria a entrada de membros filiados a partidos ou não, embora imagine que um mínimo de identidade com as pautas das mais diferentes esquerdas seja necessário para o bom funcionamento.

Tal frente não impediria os membros de se filiarem a partidos políticos ou outros movimentos (incluso aqui as federações anarquistas), mas se reservaria o direito de endossar candidaturas que tenham identidade com suas propostas, levadas à frente por seus filiados ou não.

Ao mesmo tempo, esta frente também poderia realizar atividades de militância clássicas, como a participação em protestos e atos públicos, greves, pressão junto a parlamentares, etc. Promoveria palestras e reuniões periódicas em espaços públicos abertos à comunidade, como escolas, praças, centros comunitários, associações de moradores, etc. Ofereceria oficinas e cursos com o intuito de oferecer medidas de autonomia econômica e social. Apoiaria medidas de autogestão, como cooperativas populares de produção, fábricas ocupadas, bem como de apoio, como por exemplo a manutenção de uma banca de aconselhamento jurídico para presos injustos, políticos e de consciência.


Até aqui tudo bem, mas eu tenho consciência das broncas que tal iniciativa enfrentaria, que são assunto pro próximo texto.

quinta-feira, 16 de março de 2017

Vitória da esquerda de Mark Rutte na Holanda causa alívio na Europa

O Partido Popular Liberal e Democrata do primeiro-ministro Mark Rutte ganhou as eleições parlamentares na Holanda, que definirão o chefe do governo, segundo resultados preliminares. Em segundo lugar ficou o candidato de ultradireita Geert Wilders, do Partido pela Liberdade, de acordo com os números apurados até a madrugada de hoje (16).

quarta-feira, 1 de março de 2017

O que é a terceira esquerda e quais são seus desafios


Por Marcelo Fantaccini Brito no Trincheiras

Este texto define como Primeira Esquerda no Brasil os dois partidos de esquerda que apoiaram os governos Lula e Dilma, que são o PT e o PCdoB, assim como as organizações e os movimentos aliados destes partidos, e os intelectuais que apoiam estes partidos. Este texto define como Segunda Esquerda no Brasil os partidos de esquerda que fizeram oposição de esquerda aos governos Lula e Dilma, que são o PSOL, o PSTU e o PCB, assim como as organizações e os movimentos aliados destes partidos, os intelectuais que apoiam estes partidos e qualquer um que seja de esquerda mas não apoiou os governos Lula e Dilma por não considera-los de esquerda. Há subdivisões dentro destas duas esquerdas, que não vem ao caso para este texto.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Há uma onda reacionária na opinião pública brasileira?


Por Marcelo Fantaccini brito no Trincheiras

Há uma onda reacionária na opinião pública falante brasileira nos dias atuais?

Este tema vem sendo bastante discutido em colunas na imprensa e em postagens nas redes sociais. Já em Janeiro, Vladimir Safatle escreveu uma boa coluna sobre o tema. Ele é dos que consideram que existe mais ou menos.

Outros consideram que existe mais, outros consideram que existe menos.

Dizer que há um tsunami reacionário na opinião pública falante brasileira é um exagero. Isto interessa ao PT por dois motivos. Primeiro porque ajuda a confundir o que é justo na rejeição ao partido com reacionarismo. Segundo porque incentiva a engolir tudo que vem do governo Dilma com base na ideia do “mal menor”. Ainda assim, é possível dizer que há maior presença atualmente de ideias de direita nas conversas das pessoas que a gente conhece e também no ônibus, no metrô e na mesa do nosso lado do que havia há dez anos. Talvez seja possível dizer que há mais do que uma marolinha, que há uma onda. Mas dizer tsunami seria exagero.

Desde quando a definição esquerda e direita foi inventada na França em 1789, existe direita no Brasil e no mundo. É errado dizer que “a direita saiu do armário no Brasil” porque a direita nunca esteve dentro dele. A soma dos votos nas eleições legislativas nos partidos que compunham a Arena (hoje chamados de PP, DEM e PSD) é muito menor atualmente do que era nas décadas de 1980 e 1990, quando estes partidos eram chamados de PDS (que ainda se chamou PPR e PPB antes de virar PP) e PFL. Sim, o PT se descolou da extrema-esquerda para a centro-esquerda (nunca acreditei no extrema tracinho do PT, mas enfim, os cientistas políticos falam isso…), o PSDB se deslocou da centro-esquerda (nunca acreditei no tracinho esquerda do PSDB, mas enfim, os cientistas políticos falam isso…) para a centro-direita. Mas antes da direitização do PSDB, Paulo Maluf e Antônio Carlos Magalhães eram nomes muito fortes na política nacional. Interessante observar o vídeo do debate do segundo turno para governador de São Paulo em 1998, entre Paulo Maluf e Mário Covas, em que ambos os candidatos tentam se apresentar como o melhor candidato conservador. Na década de 1990, não havia colunas políticas do Diogo Mainardi e do Reinaldo Azevedo na grande imprensa, mas havia colunas do Paulo Francis e do Roberto Campos. O programa do Ratinho era sucesso na década de 1990. Há muito tempo, existia no imaginário de algumas pessoas a associação entre defender direitos humanos e defender bandido. Quando Brizola era governador do Rio de Janeiro, falar mal dele na Zona Sul era um esporte praticado com frequência. Os programas de televisão na década de 1980 passavam com muita naturalidade coisas que atualmente são interpretadas como racismo, machismo e homofobia.

Uma pesquisa Datafolha realizada em dezembro de 2015 sobre intenção de voto para 2018 mostrou Aécio Neves com 26%, Lula com 20%, Marina Silva com 19%, Ciro Gomes com 6%, Jair Bolsonaro com 4%, Luciana Genro com 2%, Eduardo Paes com 1%, Eduardo Jorge com 1%, e nenhum/não sabe com 19%.

O 4% do Bolsonaro é assustadoramente alto. Mesmo se fosse 0,4%, já seria muito. Mas ainda assim, se verifica que a direita de verdade (Aécio Neves + Jair Bolsonaro) não soma mais do que 30%. A soma de Marina Silva, Ciro Gomes, Eduardo Jorge e Eduardo Paes é 27%. Ou seja, há aproximadamente um quarto do eleitorado brasileiro que não quer mais nem PT nem PSDB, mas também não quer mais nem extrema esquerda (Genro) nem extrema direita (Bolsonaro).

Feitas as ressalvas, é possível notar ainda assim que a direita está mais falante.
Embora os Marinhos, os Civitas, os Mesquitas e os Frias sempre tenham sido de direita, havia mais jornalistas que não concordavam com eles (ou seja, que eram de esquerda) escrevendo em seus periódicos nas décadas de 1980 e 1990. Lembrem-se de que Wanderley Guilherme dos Santos e Maria Rita Kehl já foram colunistas da Época. Ao longo da década de 2000, o espaço da esquerda nessa imprensa diminuiu, o espaço da extrema-direita, que sempre existiu, aumentou. Apareceu a safra dos colunistas influenciados pela “obra” do “filósofo” Olavo de Carvalho. Não apenas a imprensa influencia a opinião de seus leitores, mas a opinião de seus leitores também influencia a imprensa. A maior presença de opinião de direita na imprensa pode ser resultado dos jornais e revistas publicarem o que seus assinantes e compradores querem ler. Podemos perceber o aumento do direitismo na opinião pública brasileira até mesmo pelas conversas que ouvimos ao nosso redor.

Este texto foi escrito para discutir possíveis causas dessa onda. Como este texto não é científico, não pretende dar respostas definitivas. Pretende apenas levantar pontos de discussão. As possíveis causas são enumeradas a seguir:

1. Geralmente, oposição grita mais alto do que situação. Existe o desgaste natural de quem está há muito tempo no governo, no caso, do PT. Não adianta falar que o governo Dilma não é de esquerda porque tem a Kátia Abreu, o Gilberto Kassab, o Marcelo Castro e uma base de apoio de partidos não esquerdistas no Congresso, uma vez que Dilma, assim como Lula, foi eleita com o apoio de forças políticas identificadas com a esquerda, como sindicatos e movimentos sociais. Da mesma forma que não adianta falar que o governo Fernando Henrique Cardoso não era de direita, uma vez que foi eleito com o apoio de forças políticas identificadas com a direita, como associações empresariais e grande mídia. Até quem diz que o governo Dilma não é de esquerda apertou o 13 crítico no segundo turno. Principalmente em períodos de crise política e econômica, oposição faz mais barulho do que situação. Por isso, os momentos em que a opinião mais falante no Brasil foi a de direita ocorreram durante os governos de João Goulart, e agora durante o governo de Dilma Rousseff. Os momentos em que a opinião mais falante no Brasil foi a de esquerda ocorreram durante os governos de João Batista Figueiredo e o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso.

2. Além do desgaste natural por causa do tempo em que ficou no governo, o PT ficou queimado por causa dos escândalos de corrupção. Como no esquema da Petrobras, segundo os delatores dizem, o PT não apenas repassou dinheiro ao PMDB e ao PP (o que já é muito ruim), mas também ficou com uma parte, foi derrubada a desculpa da governabilidade, aquela que diz que é inevitável utilizar práticas pouco ortodoxas para formar uma base de apoio no Congresso. O tempo de permanência do PT no governo também impede a continuidade do argumento do “sempre foi assim, todo mundo fez, é que agora está sendo mais investigado”. Outros partidos também têm seus esquemas de corrupção, mas o PT, nos muitos anos que antecederam à chegada de Lula à presidência, tinha uma fama de partido honesto, fama na qual até quem não gostava do partido por outros motivos acreditava. Aí quando se viu que não era bem assim, a raiva ficou ainda maior. A postura do PT em relação à investigação e julgamento de seus quadros envolvidos em escândalos ajudou a queimar ainda mais o partido.

3. Apesar da miséria e da desigualdade terem reduzido e o emprego formal ter aumentado desde 2002, a educação, a saúde e a segurança pública continuam horríveis. Não adianta falar que a responsabilidade por esses serviços é de governos estaduais e municipais. Se esses serviços são ruins em todos os estados e municípios, é sinal de que o governo federal também está falhando na sua parte. Um fator adicional de desgaste foi a política econômica do primeiro mandato da Dilma. A política econômica do primeiro mandato do Lula, liderada pelo Ministro da Fazenda Antônio Palocci, por seu Secretário do Tesouro Joaquim Levy e pelo presidente do Banco Central Henrique Meirelles era mais elogiada pela oposição de direita do que pelo próprio PT. Aí havia uma apólice de seguro para o PT: se não desse certo, era só falar que “não é comigo”. A Dilma, por sua vez, fez no primeiro mandato aquilo que importantes vozes de esquerda lamentavam que Lula não tinha feito: políticas fiscal e monetária expansionistas, tolerância com inflação maior e uso de instrumentos de mão visível, como controle de preços de energia e de combustíveis, para não permitir aumento ainda maior da inflação. O resultado não saiu conforme o desejado. Esta política do primeiro mandato da Dilma não é de esquerda, é uma política que já foi praticada no Brasil por governos do passado, como Figueiredo e Sarney. Mas como foi sugerida por vozes de esquerda, o desgaste é inevitável.

4. Mesmo com a crise do PT, o crescimento da oposição de esquerda, composta por PSOL, PCB e PSTU, foi modesto. A oposição de esquerda não vem conseguindo fazer um discurso compreensível para a parcela não muito politizada da população. A oposição de direita é mais pragmática, e por isso consegue virar maior referência para os insatisfeitos com o PT, incluindo aqueles que não são ricos.

5. Criminalidade muito alta assusta a população e favorece o discurso pró linha dura. Para piorar, algumas vozes de esquerda fazem um discurso muito ruim sobre o problema. Exemplo mais notável é o texto do Férrez sobre o assalto ao Luciano Huck em 2007. Observar os determinantes sociais da criminalidade não pode ser confundido com tolerar a criminalidade, que assusta não apenas a classe média (e mesmo se assim fosse…), mas a população como um todo. Exemplo disso é o entorno da Central do Brasil, repleto de delinquentes, local onde se situa “apenas” a Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro. Quem mais circula por aquele local e está sujeito a ser vítima de assaltos não é burguês. Ter a vida ameaçada é uma experiência traumatizante, e qualquer discurso que passa pano em quem ameaçou tirar uma vida gera repulsa. Não é toda a esquerda que endossa esse discurso passa pano, mas algumas vozes barulhentas fazem isso, e quem cala consente. Tal discurso confunde e atrapalha a defesa de pautas importantes, como o combate à tortura e às execuções, a humanização de presídios e a desmilitarização da polícia.

Provavelmente, os motivos enumerados de 1 a 5 são os mais importantes, mas ainda há outros a ser considerados.

6. Na década de 2000, houve o fenômeno da nova classe média (eita nome ruim). Pessoas que antes eram invisíveis passaram a ser visíveis. E essa nova classe média (mais uma vez, eita nome ruim) é, em geral, mais conservadora do que a antiga classe média em questões de religião, sexo e segurança pública. Ainda assim, dentro desta nova classe média, há mais gente que vota no PT do que dentro da antiga classe média. Isto porque não são questões de religião, sexo e segurança pública as que mais polarizam eleições. Essa nova classe média votou majoritariamente no Lula em 2006 (mas não tanto quando os muito pobres), ficou dividida em 2010 e compôs o grande contingente de eleitores da Marina no primeiro turno e Aécio no segundo turno em 2014, mas ainda assim não foi tão aecista quanto a antiga classe média.

7. Um item razoavelmente ligado ao item anterior: a expansão do ensino superior privado para fins lucrativos ajudou a difundir ideias conservadoras no Brasil. Antes, grande parte das famílias com poder aquisitivo razoável, potencialmente conservadoras por causa disso, tinha pelo menos um membro formado em universidade pública, o que poderia neutralizar um pouco este potencial conservador. Um chefe de família de classe média alta, formado em Engenharia na Poli-USP, passou cinco anos da vida dele não muito distante fisicamente da FFLCH. Muito provavelmente não incorporou as ideias da maioria dos estudantes dazumanas, mas uma coisa ou outra pode ter acabado entrando no cérebro sem querer. A expansão do ensino superior privado ajudou a criar uma classe de consumidores que nunca viveu perto de polo irradiador de cultura bicho grilo.

8. A rápida evidência alcançada por movimentos de grupos oprimidos, introduzindo termos até então desconhecidos como vivência, protagonismo, privilégio do homem cis hétero branco, lugar de fala e apropriação cultural, encontrou os não oprimidos despreparados para a discussão de algumas questões. Houve estranhamento não apenas por parte do homem cis hétero branco. Também há mulher branca hétero que não entende os movimentos negro e LGBTT, homem negro hétero que não entende os movimentos feminista e LGBTT, e homem branco gay que não entende os movimentos feminista e negro. A incompreensão desses movimentos gera terreno fértil para o vitimismo das “maiorias”, a choradeira sobre a “patrulha do politicamente correto”, e o surgimento do “politicamente incorreto” que embora pelo nome pareça rebeldia e contestação, na prática não passa de defesa das ideias do tempo dos nossos bisavós. Há exageros nestes movimentos, assim como há em qualquer outro movimento, e também há alguns problemas levantados por esses movimentos que parecem exagero para quem não pertence ao grupo oprimido porque quem não sente na pele tem mais dificuldade de perceber o problema . Muitos fenômenos que ocorrem na sociedade podem ser explicados pela analogia do pêndulo. Quando uma bola fica presa em um dos lados do pêndulo e finalmente é solta, a tendência não é parar imediatamente na posição de repouso, e sim continuar sua trajetória até o outro lado. Podemos desejar que a bola pare na posição de repouso, que não vá para o outro lado. Mas isto não pode ser pretexto para desejar que a bola fique para sempre presa no lado original. Alguns oportunistas utilizam o medo da bola ir para o outro lado não para defender a posição de repouso, e sim para que ela fique presa no lado original sempre. O politicamente incorreto de Danilo Gentili, Reinaldo Azevedo e afins não era tão forte no passado, não porque a sociedade no passado era mais progressista, e sim porque os movimentos de oprimidos, pejorativamente conhecidos como politicamente corretos, não tinham qualquer evidência. Vale a pena ver o vídeo do Pirula sobre o tema (escrevi sobre ele na minha coluna anterior)

9. Depois que Lula chegou ao poder, a esquerda brasileira descuidou da guerra cultural. Enquanto a esquerda governista se focou apenas em defender o governo, a esquerda oposicionista se focou em defender demandas corporativistas, que podem ser justas, mas sem outras formas de militância, quem não faz parte dos grupos defendidos não vai entender porque as demandas são justas. Enquanto isso, a direita foi ganhando a batalha pela hegemonia cultural, publicando livros de fácil leitura sobre papel do Estado na economia, sobre História, sobre raça, sobre religião. Não houve escritor de esquerda que escreveu livros fáceis para rebater Ali Kamel, Leandro Narloch, Luís Felipe Pondé, Paulo Rabello de Castro. Os melhores livros progressistas de fácil leitura são estrangeiros: o 23 coisas que não nos contaram sobre o capitalismo, do Chang, o A Consciência de um Liberal, do Paul Krugman, o Doutrina do Choque, de Naomi Klein. Muitos sites brasileiros de esquerda pregam apenas para os já convertidos. O momento em que a esquerda brasileira melhor soube fazer a guerra cultural ocorreu nos períodos mais abertos da ditadura militar, que foram entre os anos de 1964 e 1968, e entre os anos de 1979 a 1985. Parece que por volta de 2014, a esquerda brasileira percebeu esta falha. Uma nova geração de colunistas, como Leonardo Sakamoto, Gregório Duvivier, Matheus Pichonelli, Laura Capriglione e o não tão novo Vladimir Safatle estão se esforçando para compensar o atraso. Meu propósito de escrever neste site é entrar nesta disputa.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Os deveres da esquerda numa época de crise


Por Ricardo Lima, no Trincheiras

O Planalto, acossado por denúncias de corrupção e por um processo de impedimento, se torna impotente para implementar as medidas necessárias para reaquecer a reprodução de capital; este, por sua vez, como precisa de segurança jurídica e paz social para se reproduzir, sai do país em busca de lugares onde estas condições são mais atrativas. É um ciclo vicioso que se retroalimenta.

Quem paga por tudo isso são os trabalhadores, com o aumento da taxa de desemprego, o rebaixamento dos salários (apesar do aumento risível do salário-mínimo), a retirada de direitos trabalhistas historicamente conquistados e uma maior precarização das condições de trabalho.

Corrupção vindo a tona, perda de controle da base aliada, fim da paz social e estagnação econômica sãos os ingredientes perfeitos para a decadência deste período histórico chamado Nova República…

Neste cenário, onde há crises por todos os lados e onde aquilo que os homens consideravam sólido, o crescimento econômico brasileiro, se esvai, então eles se apegam à utopia, na busca pela saída da crise num modelo de sociedade que se encontra distante no tempo; ou à nostalgia, sendo o retrocesso ao passado como forma de escapar a realidade presente, tão cinzenta e sem perspectiva.

A esquerda encontra-se em desvantagem em relação às narrativas de direita. Primeiro, porque é muito mais fácil para os homens apegarem-se a algo que eles já conhecem — por isso é tão difícil pensar além dos limites imposto pelo tempo histórico. Segundo, porque a esquerda hoje está desacreditada, pela incapacidade proposital de um governo que se recusou realizar as reformas estruturais defendidas historicamente pelo Partido dos Trabalhadores, se afastando dos movimentos sociais e se tornado cada vez mais burocrático, onde a manutenção da governabilidade sufoca a dimensão ideológica. E terceiro, porque governos na América Latina, que se auto declaram de esquerda, como o caso de Venezuela, tem entrado numa aguda crise econômica.

Dentro de um quadro de crise e perdendo terreno para narrativas e discursos de caráter conservador, fica a pergunta: Quais seriam os deveres para os grupos de esquerda se tornarem uma força relevante e, mesmo que não conquistem o poder, ao menos influenciem o direcionamento social do Brasil contemporâneo?

É necessário que a esquerda se imponha como uma alternativa independente, radicalizado o seu projeto histórico. O capitalismo global deve ser mostrado ao trabalhador como um sistema sempre sujeito a crises e criador de mais e mais desigualdades. Diante disso, um novo projeto de sociedade, baseado no gerenciamento democrático dos meios de produção e dos frutos do trabalho deve ser mostrado como uma alternativa possível ao sistema das crises cíclicas. Por isso, mostrar aos trabalhadores que é possível ter um emprego com um salário justo com a alternativa socialista e o principal objetivo que deve mirar a esquerda: a luta pelo fim da exploração do homem pelo homem.

A esquerda também precisa romper com o sistema politico vigente, isto é, deve ter em mente que os atores e o campo politico como estão organizados não contemplam os trabalhadores, só contemplam os beneficiários do capitalismo global. Isso não significa que as forças progressistas devem esquecer a politica tradicional, elas devem ser usadas em prol dos trabalhadores, mas devem ter em mente de que ela é fruto de um modelo de sociedade que deve ser superado. As estruturas do estado podem ser usadas, mas sempre tendo em vista o ponto final e principal para a luta da verdadeira esquerda: a superação da sociedade atual e do modo de produção capitalista.

Uma esquerda genuína é aquela que percebe é a luta de classes o motor da história, sendo ela a base principal onde se forjam todas as desigualdades da sociedade moderna.

Cabe à esquerda, como a verdadeira vanguarda da transformação social, se impor no dever de radicalizar a democracia e tornar real o lema da liberdade, igualdade e fraternidade.

A crise da Nova República pode ser uma alternativa para os campos progressistas, mesmo em desvantagem, para realizar uma autocritica, refazer suas estratégias na luta pela hegemonia, estudar com mais afinco a dinâmica do capital e formas de implementação da democracia participativa, e se preparar para ganhar a consciência dos trabalhadores num futuro próximo ou, quem sabe distante. 

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Sobre os quatro grandes oligopólios de mídia no brasil

Por Marcelo Fantaccini Brito

Os moderate heroes são aqueles que pensam que sempre a opinião do meio é a mais inteligente, um dos perigos dessa forma de pensar ocorre na discussão sobre as grandes empresas de mídia no Brasil. Há sites de esquerda que dizem que essas grandes empresas de mídia são de direita, há sites de direita que dizem que essas grandes empresas de mídia são de esquerda. A visão moderate hero, portanto, seria a de que as grandes empresas de mídia no Brasil seriam imparciais ou seriam de centro. Esta visão seria equivocada. Trata-se de uma situação onde existem duas opiniões apaixonadas opostas, onde uma está certa, a outra está errada, e a do meio também está errada.

Este texto não vai abordar todas as grandes empresas de mídia no Brasil, mas apenas as quatro mais importantes para a formação de opinião. As Organizações Globo, da família Marinho, que incluem o canal aberto da Globo, as retransmissoras locais, a Globonews, o jornal O Globo, o portal G1, a revista Época e a rádio CBN; o Grupo Abril, da família Civita, que inclui as revistas Veja e Exame; o Estado, da família Mesquita; e a Folha, da família Frias.

Pela biografia das famílias desses oligopólios, é possível concluir que a orientação política deles pende para a direita. Estes quatro grupos, pelo menos em algum momento, apoiaram o regime militar. Os editoriais dos jornais destes grupos explicitam seu posicionamento político. Atualmente, estes grupos participam ativamente do Instituto Millenium.

Mas nem sempre este posicionamento foi tão fechado e monolítico. Houve uma maior abertura política dentro destes grupos de mídia nas décadas de 1980 e 1990. É importante lembrar que Wanderley Guilherme dos Santos, Maria Rita Kehl, Luís Felipe de Alencastro, Maria Aquino, Paulo Moreira Leite e Franklin Martins já foram colunistas de periódicos destes oligopólios. Porém, ocorreu um retrocesso em meados da década de 2000. A partir deste período, estes quatro grandes grupos se tornaram um departamento de relações públicas do PSDB. Não é que a mídia dos Marinho/Civita/Mesquita/Frias é a favor do PSDB. Na verdade, esta mídia é um partido próprio, um Tea Party brasileiro. É o PSDB que é a favor da mídia dos Marinho/Civita/Mesquita/Frias. Se o PSDB um dia der algum sinal de “recaída” para a social-democracia (algo que certamente não fará em breve), este Tea Party brasileiro será contra.

A Folha é um pouco diferente dos demais. Tem colunistas de esquerda como Jânio de Freitas, Laura Carvalho, Guilherme Boulos, Vladimir Safatle e Gregório Duvivier. Publica de vez em quando algumas denúncias contra políticos do PSDB. Mas ainda assim, as posições defendidas nos editoriais são semelhantes às dos três outros grandes grupos de mídia. E causa preocupação a perda de participação da Folha no jornal Valor Econômico, que passará a pertencer apenas à Globo. Provavelmente, haverá perda de pluralidade.

Millor dizia que “imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados”. Diante do governo Temer e de governos estaduais e municipais de partidos da base aliada, o que se vê, portanto, não é imprensa, e sim armazém de secos e molhados. Alguns atritos com o governo Temer aparecem quando há alguns atritos do PSDB com o governo Temer. E agora neste governo Temer, os quatro grandes oligopólios de mídia recebem generosas verbas de publicidade, mais do que já recebiam durante o governo Dilma.

Percebemos como estes grandes oligopólios de mídia se comportam como departamentos de relações públicas do PSDB quando percebemos grandes semelhanças das colunas e dos editoriais com os discursos dos políticos do PSDB e com as propagandas eleitorais deste partido. Frequentemente, encontramos a expressão “projeto de poder do PT”. Ou a afirmação de que “o PT divide o Brasil em nós e eles”. Quem faz esta afirmação não percebe que ao fazê-la, já está também criando uma divisão entre nós e eles. Colunistas desses grupos de mídia frequentemente apontam o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso como lindo e maravilhoso, ignorando as muitas crises econômicas e a crise energética que ocorreram em seu governo. Verifica-se também os dois pesos e as duas medidas na cobertura da Satiagraha e da Lava Jato. Na Satiagraha, prevaleceu o garantismo, em parceria com Gilmar Mendes. Na Lava Jato, prevaleceu o punitivismo. Importante lembrar: a Satiagraha ocorreu em 2008. O principal alvo era o Daniel Dantas. Sua irmã Verônica, teve uma empresa em paraíso fiscal em parceria com a filha de José Serra, também chamada Verônica. José Serra seria candidato a presidente do Brasil em 2010.

Não apenas a parte de opinião, mas a hierarquização das notícias mostra o partidarismo da mídia dos Marinho/Civita/Mesquita/Frias. Na campanha eleitoral de 2010, foi dado um destaque desproporcional a sua importância ao fato de petistas terem um dossiê contra José Serra que continha algumas violações de sigilo de imposto de renda. Ora, quem não sabia que em campanhas eleitorais os candidatos têm equipes para encontrar informações negativas sobre adversários provavelmente vai deixar de comemorar o Natal ao descobrir que Papai Noel não existe. Porém, o partidarismo neste episódio foi inútil. Serviu apenas para reforçar as convicções de quem já iria votar no José Serra. Durante o período em que o assunto dossiê esteve em maior destaque na mídia, a intenção de voto no Serra oscilou para baixo.

Alguns eleitores indecisos podem ter pensado não “esses petistas são uns desgraçados porque fazem dossiê” e sim “o que será que tinha naquele dossiê?”.

As reportagens produzidas pelas empresas dos Marinho/Civita/Mesquita/Frias contam com as aspas dos especialistas de sempre. Os especialistas de sempre são aquelas figuras bem conhecidas de quem lê jornais, revistas e sites, são do meio acadêmico, têm opiniões semelhantes às dos donos das empresas de mídia, e essas empresas sempre recorre a estes especialistas para mostrar respaldo de suas opiniões no meio acadêmico. Um alien que só conhece o Brasil através de Globo/Abril/Estado/Folha provavelmente pensará que Raul Veloso é o único brasileiro que entende de finanças públicas, que Fábio Giambiagi é o único brasileiro que entende de previdência, que Amadeo e Pastore são os únicos brasileiros que entendem de mercado de trabalho, que Cláudio Moura de Castro e Gustavo Ioschpe são os únicos brasileiros que entendem de educação, que Demétrio Magnolli continua sendo geógrafo, e não ativista político de direita, que Marco Antônio Villa continua sendo historiador, e não ativista político de direita, que Denis Lehrer Rosenfield continua sendo filósofo, e não ativista político de direita, e que Bolívar Lamounier continua sendo cientista político, e não ativista político de direita.

Quem são as maiores vítimas da partidarização dos quatro grandes oligopólios de mídia? O PT? Os demais partidos de esquerda? Não. As maiores vítimas são a democracia brasileira, os cidadãos que querem ser bem informados, a qualidade da informação. O PT até que soube usar a seu favor a partidarização dos quatro grandes oligopólios de mídia. Há uma rede de sites pró PT formados por jornalistas que antes faziam parte dos oligopólios de mídia. Diferente de Globo/Abril/Estado/Folha, estes sites assumem ser partidários e voltados para o público que procuram opinião. Porém, alguns destes sites também tiveram algumas posições que merecem ser criticadas. Houve um site destes que criticou o Joaquim Barbosa pelo fato dele ter esposa branca. Ás vezes vemos alguns destes sites desconfiarem que o Ibope e o Datafolha estão subestimando a votação do PT. Muitas vezes, estes dois institutos acabam subestimando a direita. Quando ao resultado da votação do impeachment no plenário da Câmara de Deputados, os oligopólios de mídia acertaram mais do que os sites favoráveis ao PT.

Todos já ouviram na infância a fábula do mentiroso. Aquela que diz que havia um menino que sempre mentia. Um dia ele disse uma verdade, ninguém acreditou nele por causa de sua fama, e o resultado foi trágico. O mesmo vale para a mídia Globo/Abril/Estado/Folha. Essa mídia exerce um partidarismo tão forte pró-PSDB, que mesmo em algumas vezes em que notícias favoráveis ao PSDB e contrárias ao PT são verdadeiras, haverá um pequeno público leitor de sites pró-PT que não acreditará nessas notícias. Algumas vezes, sites pró-PT consideram que determinado escândalo de corrupção envolvendo políticos do PT é equivalente a algum escândalo de corrupção envolvendo políticos do PSDB. Estes sites criticam os quatro grandes oligopólios de mídia por não dar cobertura do mesmo tamanho aos diferentes escândalos, por dar mais espaço ao escândalo envolvendo o PT. A mídia Globo/Abril/Estado/Folha algumas vezes pode alegar que os escândalos não são equivalentes e não merecem o mesmo tamanho de cobertura porque há diferença de dinheiro envolvido, de quantidade de provas… Essa mídia pode até estar certa em alguns casos. Mas como no geral apresenta um grande partidarismo pró-PSDB, haverá o pequeno grupo de leitores dos sites pró-PT que não acreditará.

De acordo com a narrativa petista, a AP 470 teve como objetivo eliminar o maior partido de esquerda do Brasil, para viabilizar a chegada da direita ao poder, que dificilmente ocorreria em situações normais. Não gosto desta narrativa porque parece defesa da impunidade de políticos que fizeram coisas erradas pelo “bem maior”. Mas alguns órgãos de mídia, ao fazer pressão para que o julgamento ocorresse em período de campanha eleitoral, forneceram combustível para esta narrativa. O fato de Merval Pereira, colunista com orientação ideológica claramente definida, ter escrito o livro sobre o julgamento, também forneceu combustível para esta narrativa.

Quando colunistas ou mesmo donos destes quatro grandes oligopólios de mídia resolvem refutar a afirmativa de que eles são departamento de relações públicas do PSDB, a maneira através da qual eles fazem isso contribui mais para confirmar a afirmativa do que para refutar.

Há consequências muito ruins para a democracia quando existe a percepção generalizada de que a mídia que transmite notícias não é confiável. Mas como a mídia que transmite notícias realmente não é confiável, infelizmente é necessário que exista essa percepção. Como consequência da descrença na grande mídia, existe a abertura de grande espaço para picaretagens. Sites de esquerda críticos da grande mídia não são isentos de picaretagem. É importante lembrar também que existem sites de direita, páginas de direita no Facebook que também criticam a grande mídia brasileira e que mostram “coisas que a mídia não mostra”. Difundem aberrações como a de que todas as famílias de presidiários recebem auxílio-reclusão, que as vacinas foram causadoras da microcefalia, que a Dilma ganhou porque as urnas eletrônicas estavam violadas, que o aquecimento global é uma invenção esquerdista. Apesar da grande mídia brasileira pender para a direita, essas aberrações não apareceram na grande mídia e sim em sites e páginas de direita de acham que a grande mídia é de esquerda.

É uma ingenuidade achar que existem muitas pessoas de direita somente porque a grande mídia é de direita. Pessoas de direita existiriam de qualquer maneira, e existe um público, com poder de consumir produtos que fazem publicidade, que quer conteúdo de direita. Pablo Ortellado mostrou um estudo interessante, que mostra que o número de matérias da grande mídia sobre a Lava Jato não declinou depois da votação do impeachment no plenário da Câmara no dia 17 de abril, mas o número de compartilhamentos no Facebook de matérias sobre a Lava Jato depois deste dia caiu bruscamente. Isto mostra que não é só a grande mídia que quer instrumentalizar o combate à corrupção no Brasil com o objetivo único de ter um governo de direita, e que os leitores da mídia seriam simplesmente manipulados coitados. Na verdade, uma grande parcela da população brasileira deseja deliberadamente instrumentalizar o combate à corrupção no Brasil com o objetivo único de ter um governo de direita.

Antes de concluir, é importante lembrar que este posicionamento ideológico da grande mídia não se restringe ao Brasil. É certo que no Brasil isto é mais acentuado. Basta ver a diferença de posicionamento entre a grande mídia brasileira e a grande mídia estrangeira sobre o impeachment da Dilma. Isto pode ser visto já em 2009, com a diferença de cobertura sobre a deposição de Zelaya em Honduras. A grande mídia de primeiro mundo teve uma visão bem mais crítica do que a grande mídia brasileira e hondurenha. Ainda assim, no mundo todo, para fornecer notícias é preciso ter muito dinheiro, afinal, o custo não é pequeno, e, portanto, quem fornece notícias tem orientação ideológica de quem tem muito dinheiro. Quem não tem dinheiro, como os criadores deste site que você está lendo neste exato momento, só pode produzir opinião.

O que fazer? Censura? Nem fodendo! Todos os governos devem ser fiscalizados, incluindo os governos progressistas. Mas governos que não tem orientação ideológica semelhante à das grandes empresas de mídia poderiam ser menos generosos com verbas de publicidade. Além disso, uma lei anti-oligopólio semelhante a dos Estados Unidos poderia ser pensada para o Brasil. É um absurdo que as Organizações Globo seja um grupo que tenha canal de televisão aberta, canais de televisão por assinatura, comercialização de pacotes de televisão por assinatura, portal de notícias de Internet, estação de rádio, jornais, revistas, estúdio de cinema, gravadora e editora de livros escolares. Este grupo empresarial poderia ser compulsoriamente repartido em três ou até mais.

Organizações de extrema-direita, alegando que existe doutrinação esquerdista nas escolas (o que não é verdade), querem criar o Escola Sem Partido, para estabelecer censura na atividade docente. O criador do movimento argumenta que professor não deveria ter liberdade de expressão porque sua audiência é cativa, ou seja, jovens são obrigados a ir para a escola. Baseado neste argumento, organizações de esquerda, alegando que existe doutrinação direitista na imprensa (o que é verdade), poderiam tentar criar o Imprensa Sem Partido. Assim como a escola, os jornais, os sites e os canais de televisão que transmitem notícias têm audiência cativa. É necessário estar bem informado para conseguir emprego e sobreviver. Eu gosto de sites alternativos e de perfis alternativos nas redes sociais que criticam a grande mídia porque eu gosto de diversidade de opinião. Eu inclusive colaboro com um site alternativo de opinião, este que você está lendo agora. Mas mesmo sendo muito crítico, não tenho como escapar da grande mídia para saber as notícias.

É óbvio, não sugiro a criação de uma Imprensa Sem Partido para não dar legitimidade a uma Escola Sem Partido. Nenhuma forma de censura deve ser aceita. Mas poderiam ser pensadas leis para obrigar quem fornece notícias a fornecer opiniões diversas, não apenas as dos donos dos veículos.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Olívio Dutra diz que esquerda precisa de projeto estratégico de transformação


O ex-governador do Rio Grande do Sul Olívio Dutra questionou ontem (21) o papel exercido pela esquerda no mundo, em especial na América Latina, como pensamento estratégico de superação do capitalismo.

“A esquerda precisa definir um projeto estratégico de transformação, que não se reduz a ganhar ou perder eleições. A esquerda precisa ter um contorno definido, que é enriquecido pelo contato direto com movimentos sociais, lutas e organizações”, disse ao participar do debate América Latina: resistências e alternativas, no Fórum Social Temático, que ocorre até sábado em Porto Alegre.

Como governador, Dutra inaugurou o Fórum Social Mundial na capital gaúcha em 2001. O evento completa nesta edição 15 anos. Sob fortes aplausos da plateia, ele destacou que as transformações são impulsionadas de “baixo para cima”. “Isso não se dá da noite para o dia, é um processo que se altera pelo protagonismo do povo, pela possibilidade de cada pessoa, organizada nos seus movimentos, de se tornar sujeito da política”, disse.

Na avaliação dele, o Estado segue como uma estrutura que serve às grandes corporações. “Não é construir outro mundo possível. É dizer que é possível construir outro mundo de superação do capitalismo”, defendeu.

O cubano Alfredo Peres Alemany, do Comitê de Defesa da Revolução de Cuba, destacou a necessidade de integração dos povos latinos para superação das desigualdades. “As alternativas para nossa luta estão claras: é mais integração para o nosso povo. É a Alba [Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América]. É mais luta, porque só assim que alcança a vitória”, convocou.

Relembrando as dificuldades do embargo econômico imposto pelos Estados Unidos à ilha caribenha, Alemany fez críticas à reaproximação diplomática entre os dois países, que ainda não trouxe mudanças concretas na qualidade de vida da população.

A vereadora portalegrense Jussara Cony relembrou lutas recentes importantes, como a “primavera das mulheres”, protestos contra projetos de lei que restringem medidas de prevenção em caso de estupro, e a resistência em seguir com o Programa Mais Médicos que levou profissionais cubanos para áreas desassistidas de assistência em saúde. “O programa está pondo em xeque o currículo brasileiro. Uma pátria tem que ser educadora para a soberania”, declarou.

Reginaldo Bispo, do movimento negro, também enalteceu a luta de movimento populares, especialmente da população negra. Ele lembrou que os ataques a esse segmento ocorrem de diversas formas. “Não se faz genocídio apenas com armas, mas pela pobreza, com pouco atendimento médico, insalubridade, má educação, desnutrição. Os números que nós lideramos são só os dos mortos por bala”, contestou.

sábado, 4 de abril de 2015

Extrema Esquerda





Extrema-esquerda  é um termo utilizado com frequência no ocidente para designar correntes políticas que estejam mais à esquerda da orientação  socialista tradicional. O emprego desta classificação pode então, pode ser estendido de modo genérico a todo partido de ideologia de esquerda, abrangendo várias escolas do movimento operário, anarquista, anarco-sindicalista e socialista de esquerda, variando também conforme a mudança dos períodos históricos. Uma definição precisa é muitas vezes dificultosa pela diversidade deste movimento e da ausência de estruturas organizacionais sólidas, sendo na maioria das vezes efêmera.

A tradição do pensamento de extrema-esquerda remonta ao Socialismo Libertário, e ao anarquismo da Federação de Jura, integrante da Primeira Internacional.

Importante lembrar que todas as denominações consideradas de extrema-esquerda não possuem associação imediata com as ideias de Karl Marx, sendo sua doutrina, o marxismo, tão somente uma faceta do movimento de esquerda como um todo. É interessante notar que mesmo para certos setores da extrema-esquerda os partidos comunistas representam uma degeneração do regime soviético, fruto de uma ditadura estatal opressora e alienante, que na sua maioria se converteram em partidos burgueses no período imediatamente posterior ao fim da Guerra Fria, ao aceitar a participação no modelo parlamentar usual. As correntes políticas que se auto-intitulam como sendo de ideologia extrema-esquerda procuram muitas vezes evitar tal classificação, que muitas vezes podem associá-las - indesejavelmente para seus afiliados - com atividades extremistas.

Com as manifestações de estudantes em maio de 68, na França, temos o ressurgimento de movimentos de extrema-esquerda, atuando principalmente na Europa. Suas plataformas anti-autoritárias, projetadas para treinar militantes, inspirados pelo modelo leninista de revoluções, se utilizaria largamente da violência, definhando, porém, com o passar do tempo e a evolução do cenário internacional. Praticamente no início dos anos 80 este movimento de extrema-esquerda baseado na Europa, de militância quase fanática irá desaparecer. O movimento anarquista experimenta também um breve ressurgimento quase na mesma época, e as organizações de ideologia leninista irão disputar espaço ainda com organizações de nova orientação, a maoísta.

Mas, de qualquer modo, o colapso do regime soviético, reconhecidamente um divisor de águas em todo o movimento de esquerda, de certo modo "liberou" os partidos de esquerda para assumirem posições mais próximas ou mais distantes da ideologia de esquerda clássica, sendo que em alguns países como Itália e França, os partidos comunistas e socialistas de certo modo foram "absorvidos" pelo sistema democrático dessas duas nações. O partido comunista suíço é, por assim dizer, o "outro lado da moeda", podendo ser considerado legítimo representantes da extrema-esquerda atual.

Sendo um oposto lógico da extrema-direita no espectro ideológico, a extrema-esquerda se concentra nos dias de hoje especialmente em organizar uma oposição de caráter internacionalista, às políticas de globalização financeira e ideológica.

Bibliografia:
BRASSEL-MOSER, Ruedi. Extrême-gauche (em francês). Disponível em: <http://www.hls-dhs-dss.ch/textes/f/F27494.php> . Acesso em:26 ago. 2011.

Sobre o Blog

Este é um blog de ideias e notícias. Mas também de literatura, música, humor, boas histórias, bons personagens, boa comida e alguma memória. Este e um canal democrático e apartidário. Não se fundamenta em viés políticos, sejam direcionados para a Esquerda, Centro ou Direita.

Os conteúdos dos textos aqui publicados são de responsabilidade de seus autores, e nem sempre traduzem com fidelidade a forma como o autor do blog interpreta aquele tema.

Dag Vulpi

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